Desde que, no ano passado, precisou abandonar a catedral de Loikaw devido aos combates, monsenhor Celso Ba Shwe vive com o seu povo na floresta. "A minha força são eles: nossa Igreja está mais viva do que nunca."
"Ninguém mais vive em Loikaw," conta o bispo. "A maioria dos edifícios foi queimada e destruída, especialmente nas áreas cristãs. Em muitas partes da cidade, não se pode voltar também por causa das minas terrestres e dos artefatos explosivos não detonados. Apenas os membros das Forças de Defesa Popular (PDF) retornam para tentar encontrar suas famílias, mas também para eles é perigoso." As PDF são descritas como o braço armado do governo de unidade nacional no exílio. Formadas em abril de 2021, após o golpe militar que levou ao conflito civil, elas são compostas por jovens, inclusive cristãos, que antes da guerra somavam mais de 90 mil em todo o estado de Kayah, entre uma população de 350 mil habitantes.
"Estão lutando por seu futuro e sua liberdade," comenta o bispo. "Eles testemunharam o progresso democrático nos anos de Aung San Suu Kyi, entre 2015 e 2020. Agora os jovens sabem que existe um espaço onde podem expressar suas liberdades e estão convencidos de que lutam pela justiça. "Contudo, continua o prelado, "mesmo os jovens estão cientes de que a guerra não é a solução para se obter um estado democrático. Precisamos de diálogo. O que a Igreja quer e pede é que as PDF se apresentem como um grupo unido. Talvez isso aconteça um dia, mas por enquanto ainda é muito difícil."
A ideia de um Estado federal em Mianmar continua em segundo plano, mas é complicada pelo fato de que, nos territórios libertados do exército, as milícias étnicas (grupos armados que, ao contrário das PDF, combatem o governo central desde a independência do Império Britânico em 1948) estabeleceram administrações contrárias à vontade da população civil. "No estado de Kayah, pelo menos 600 jovens já morreram nos combates," conta com tristeza monsenhor Ba Shwe, originário da aldeia de Moblo. "Ainda assim, as famílias apoiam as PDF: nos campos para desabrigados, muitas pessoas carecem de comida, mas todos guardam algo para os combatentes. Eles se orgulham de seus filhos e rezam pelo seu sucesso e segurança."
A comunidade cristã de Loikaw está espalhada por 200 campos de refugiados na floresta, onde, de acordo com dados do ano passado, vivem cerca de 150 mil pessoas. "Eles vivem longe das aldeias, em áreas remotas onde não há conflito," diz o bispo. Mas ele logo se corrige: "Não podemos realmente dizer que não há conflito, porque um bombardeio ou ataque de artilharia pode ocorrer a qualquer momento."
"As pessoas dependem de doações internacionais e da generosidade dos moradores locais que as acolhem. Alguns conseguem terras emprestadas para cultivar arroz ou verduras, mas é sempre arriscado; qualquer um pode ser atingido pelos tiros do exército a qualquer momento." As crianças enfrentam a situação mais dramática. Às vezes, até jovens de 12 ou 14 anos se juntam à luta armada. "Entre a pandemia e a guerra civil, alguns não vão à escola há cinco anos," continua monsenhor Celso, que foi administrador apostólico da diocese por três anos antes de ser ordenado bispo em 29 de junho de 2023.
No último ano, ele incentivou a criação de pequenas escolas informais entre os desabrigados, na tentativa de formar a geração que deverá reconstruir o país: "Como tememos bombardeios militares nos locais onde muitas pessoas se reúnem, dividimos as classes em diferentes lugares, entre tendas e cabanas na floresta. As crianças aprenderam a olhar para o céu para ver se chegam bombas. Se avistam um jato, sabem que devem correr para outro lugar. Estudam em meio ao perigo: como conseguem, professores e alunos, se concentrar?"
Falta arroz e água (coletada a quilômetros de distância), e cerca de dez campos de refugiados foram destruídos pelas inundações causadas pelo tufão Yagi, que em setembro matou pelo menos 200 pessoas em Mianmar. Mesmo assim, este bispo fala da vida de sua comunidade com um sorriso: “Minha força vem das pessoas; elas me dão coragem”, nos explica. “Depois de se instalarem nos campos, começaram a perguntar: ‘Onde estão nossos lugares de culto? Queremos construir uma igreja, bispo, pode nos ajudar?’. Agora, quase em cada campo, há um espaço para rezar, sinalizado por uma pequena cruz. É uma Igreja na natureza, e é muito bonito.”
A catedral de Loikaw — que abrigava cerca de 70 pessoas, entre religiosos e aqueles impossibilitados de fugir, especialmente idosos e deficientes — estava cercada por centenas de soldados há duas semanas quando, em novembro de 2023, monsenhor Ba Shwe foi forçado a abandoná-la. “Em dezembro voltamos, mas pegamos apenas os registros de batismos, com os quais os padres agora procuram as pessoas de sua paróquia entre os desabrigados.” Todo o resto foi perdido. Até mesmo as sepulturas dentro da catedral foram desenterradas, provavelmente porque os militares temiam que armas estivessem escondidas ali.
“Sou um bispo sem catedral, mas estou feliz”, explica. “Quando fugi de Loikaw, muitas pessoas me ofereceram ir para Taunggyi ou para outros lugares seguros onde não há combates. Mas como poderia deixar meu povo? Devo estar onde está o meu rebanho. As pessoas não têm a igreja, mas têm os seus lugares para rezar. É uma experiência que, com todas as suas dificuldades, me lembra a vida dos primeiros cristãos. Muitos me perguntam: ‘Bispo, quando voltaremos à catedral?’. Eu respondo que a Igreja não é um prédio. Quando as pessoas estão juntas, cuidam umas das outras, quando se amam: ali está a Igreja.” Uma comunidade renasceu na tragédia da guerra: “Os párocos e as freiras agora se dedicam com mais empenho à população”, continua monsenhor Ba Shwe. “Em alguns campos de refugiados, não havia catequistas. Mas qualquer pessoa que soubesse guiar a oração ou ler o Evangelho e as Escrituras tornou-se um novo evangelizador.”
A Caritas de Loikaw também continua ativa: atua nos casos mais urgentes, quando as pessoas ficaram sem comida ou dinheiro. “Não conseguimos estruturar-nos como uma ONG, mas estamos sempre ao lado do povo, com uma clínica móvel para atendimentos médicos e com um grupo de apoio para os mais traumatizados. As freiras, principalmente, estão perto de quem sofre. E assim alcançamos aqueles que as agências internacionais não conseguem alcançar nas áreas remotas.”
“Há muitos desafios e dificuldades, mas Deus está nos ajudando”, afirma com convicção monsenhor Ba Shwe. “Quando me dizem: ‘Bispo, não temos arroz para as crianças’, sempre aparece alguém que me liga oferecendo ajuda. O que temos não é suficiente, mas agimos um pouco de cada vez.”
Por Alessandra De Poli - Mondo e Missione - tradução e adaptação Valesca Montenegro
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