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Prevost, suas viagens à China e as missões agostinianas em Hunan

Ao cardeal de Hong Kong, Stephen Chow, o papa contou “ter visitado a China e conhecido sua realidade e cultura”. Um fato inédito para um pontífice, ligado ao longo mandato como prior geral de uma ordem que, por vontade de Leão XIII (o pontífice de quem retomou o nome), teve seus próprios missionários e bispos em Hunan até a expulsão decretada por Mao. E que, após os anos 1980, reconstruiu vínculos e presenças na diocese de Changsha por meio da província das Filipinas.

Na imagem: igreja e comunidade de uma das missões agostinianas no norte de Hunan no início do século XX. - (Foto do perfil no Facebook da Província do Santíssimo Nome de Jesus dos Agostinianos das Filipinas)
Na imagem: igreja e comunidade de uma das missões agostinianas no norte de Hunan no início do século XX. - (Foto do perfil no Facebook da Província do Santíssimo Nome de Jesus dos Agostinianos das Filipinas)

Robert Francis Prevost “visitou a China em várias ocasiões e conheceu sua cultura e realidade”, afirma o cardeal Stephen Chow Sau-yan, bispo de Hong Kong, em uma entrevista sobre o conclave e o novo pontífice publicada pelos meios de comunicação da diocese de Hong Kong. Essa revelação despertou grande interesse em um aspecto importante da trajetória de Leão XIV. Tanto que muitos se perguntam como ele enxergará a China, à luz das aproximações promovidas pelo Papa Francisco, que culminaram no acordo de 2018 sobre as nomeações episcopais e alimentaram o sonho de ver um Papa visitar Pequim e os católicos da China continental — algo frequentemente mencionado nos últimos anos.


Um fato inédito para a Igreja

As declarações do cardeal Chow revelam um fato inédito para a Igreja Católica: o atual ocupante do trono de Pedro já esteve na China continental. Isso é notável, considerando que, entre seus predecessores, apenas Paulo VI visitou Hong Kong — quando ainda era uma colônia britânica — durante sua viagem apostólica à Ásia. Bento XVI, quando ainda era o cardeal Joseph Ratzinger, participou de conferências na mesma cidade como prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, muito antes de se tornar Papa.


Viagens discretas, mas significativas

Mencionar as viagens de Prevost à China é valioso por outro motivo. Assim como em outras viagens que fez como prior-geral dos Agostinianos, cargo que ocupou de 2001 a 2013, não há informações disponíveis sobre essas visitas nos sites ou publicações da ordem.


Uma longa amizade entre os Agostinianos e a China

É fácil deduzir o contexto. Como muitos outros institutos missionários, a ordem à qual Leão XIV pertence também tem uma presença significativa e uma longa amizade com a China. E esse vínculo não é apenas coisa do passado.


Martinho de Rada (1533–1578), um agostiniano de origem espanhola que estudou chinês em Cebu (Filipinas), é o personagem mais conhecido dessa história. Em 1575, ele acompanhou uma delegação espanhola à corte Ming, na China. Sete anos antes da chegada do jesuíta Matteo Ricci a Macau, essa visita foi o primeiro encontro entre um missionário católico da era moderna e a China. O detalhado relatório que Martinho de Rada escreveu logo após essa viagem foi de importância fundamental para apresentar à Europa do século XVI as culturas do Oriente.


O impulso missionário de Leão XIII

O vínculo entre os Agostinianos e a China foi renovado três séculos depois, quando o Papa Leão XIII estabeleceu uma presença missionária permanente. Esse é o mesmo pontífice que inspirou o cardeal Prevost na escolha de seu nome papal após sua eleição.

De fato, em 1879, com o breve Ex debito Pastoralis Officii, Leão XIII confiou a missão do norte de Hunan aos Agostinianos filipinos da Província do Santíssimo Nome de Jesus, que estabeleceram um vicariato apostólico nessa província do sul da China. Segundo as crônicas da ordem, missões muito ativas foram fundadas nos anos seguintes, especialmente nas atuais cidades de Changde, Lixian e Yueyang. Durante 70 anos, os bispos agostinianos dirigiram esse território eclesiástico, que foi formalmente erigido como Diocese de Changde em 1946, sob a província eclesiástica de Changsha.


Expulsão e continuidade local

Como todos os demais missionários estrangeiros, os Agostinianos foram expulsos pelo regime comunista chinês no início da década de 1950, incluindo o bispo Gerardo Faustino Herrero Garrote.

Ainda assim, a presença agostiniana foi claramente importante para a Igreja local, a ponto de as autoridades chinesas terem escolhido um agostiniano, o padre Michael Yang Gaojian, como bispo “patriótico” de Changde. Ordenado sacerdote em 1938 e mais tarde nomeado superior regional da ordem na China, ele foi um dos primeiros bispos sagrados sem mandato papal.


Outro frade agostiniano chinês, o padre James Li Shu-ren, foi ordenado bispo “patriótico” de Yueyang, uma cidade em Hunan onde a igreja local ainda leva o nome de Santo Agostinho.


O bispo Yang Gaojian, importante figura da Associação Patriótica, faleceu em 1995, seguido dois anos depois pelo bispo Li Shu-ren.

Desde então, toda a parte norte de Hunan foi incorporada a uma única Diocese de Changsha, capital administrativa da província, após a redefinição das fronteiras eclesiásticas pelas autoridades chinesas.

O bispo Methodius Qu Ailin, de 64 anos, dirige a diocese desde 2012, com status posteriormente reconhecido pelo Vaticano segundo os termos do acordo de 2018.


A presença agostiniana hoje

Nesta diocese, os Agostinianos ainda mantêm uma presença no norte de Hunan por meio do seu Vicariato do Oriente, com sede nas Filipinas.

Também é importante notar que, após a tempestade da Revolução Cultural, algumas irmãs agostinianas chinesas reconstituíram sua família religiosa e estabeleceram recentemente uma presença missionária nesta parte da China. Os bispos agostinianos dos vicariatos e prefeituras do norte de Hunan sempre insistiram na presença de religiosas. Esse pedido foi atendido em 1925 com a chegada de quatro freiras agostinianas espanholas que viveram seu ministério servindo a comunidade local por 25 anos. Elas também tiveram que partir em 1950, mas a semente que plantaram — apesar da dissolução forçada e das imensas provações durante os anos de perseguição — não se perdeu.


A nova geração de irmãs na China

Na década de 1980, quando a China sob Deng Xiaoping deu os primeiros sinais de uma política religiosa mais liberal, uma senhora idosa que fora freira agostiniana reuniu algumas jovens ao seu redor, reativando o instituto e retomando o contato com o governo-geral da ordem. Assim, como relatam os missionários agostinianos em seu site:

“Atualmente, há quatro irmãs chinesas na China. Elas se dedicam ao trabalho pastoral na paróquia onde vivem e em outros povoados vizinhos. Seu trabalho consiste em acompanhar os católicos na vivência da fé. Visitam famílias, doentes, rezam com eles, preparam liturgias e conduzem momentos de oração.”

Uma experiência preciosa para um Papa missionário

Não é difícil imaginar que essas comunidades em Hunan tenham sido algumas das etapas da jornada de Robert Francis Prevost pela China. E que, por meio do contato com agostinianos chineses e com a província filipina da ordem — que ele visitou em 2004 e 2008 — ele tenha se familiarizado com a “cultura e realidade chinesas” mencionadas pelo cardeal Chow. Essa experiência é preciosa para um Papa missionário, que agora olha também para os desafios da China com esse olhar vivido e dialogante.


Por Giorgio Bernardelli - AsiaNews - tradução e adaptação redação Mundo e Missão

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